Por Pedro A. Ribeiro de Oliveira*
Em seu discurso após sua diplomação, o Presidente eleito usou a metáfora da semente para referir-se à democracia que “não nasce por geração espontânea. Ela precisa ser semeada, cultivada, cuidada com muito carinho por cada um, e a cada dia, para que a colheita seja generosa para todos.” Num discurso de 14 minutos, a palavra democracia foi dita 19 vezes. Por que tanto cuidado, se afinal há mais de um século o Brasil vive no regime republicano? A resposta está na história dessa república.
Fruto de um golpe militar que derrubou a monarquia, a república brasileira conservou o caráter oligárquico do poder político até a promulgação da Constituição de 1934, que foi revogada três anos depois, ao instaurar-se o Estado novo. Em 1946 foi promulgada outra Constituição, que possibilitou a primeira experiência real de democracia. Embora não contemplasse os setores socialmente marginalizados, em sua maioria analfabetos, ela abriu para as classes trabalhadoras a possibilidade de concorrer às eleições e assim participar das decisões políticas. Porém, assim que essa experiência começou a imprimir novos rumos ao Brasil, ela foi tolhida pelo golpe de 1964, que estabeleceu o regime autoritário e a Constituição de 1967. Só em 1985 foi eleito um congresso constituinte que elaborou a primeira Constituição brasileira com efetiva – embora minoritária – participação das classes trabalhadoras: a Constituição cidadã de 1988, até agora em vigor.
Desde então o Brasil vive a experiência histórica de democracia respaldada numa Constituição que assegura os direitos de cidadania também aos setores minoritários ou socialmente marginalizados. Por isso mesmo ela é atacada pelos setores social e economicamente dominantes, inconformados com a possibilidade da maioria dominada, constitucionalmente empoderada, colocar um fim em seus privilégios.
A esse fato referiu-se o Presidente do Superior Tribunal Eleitoral, em seu discurso na cerimônia de diplomação do Presidente e do Vice-Presidente da República, ao denunciar quem, “seguindo a cartilha autoritária e extremista daqueles que, no mundo todo, não respeitam a democracia e o estado de direito (…) atacaram a independência do Poder Judiciário, disseminando desinformação e discurso de ódio”.
É este o quadro político atual: a Democracia tem a força histórica de um valor universal, mas em nosso País ela encontra-se ainda em estado de semente que teima em crescer apesar das pedras, espinhos e aridez do tecido social brasileiro. Ajudar no seu processo de crescimento é o grande desafio de quem ama o povo brasileiro e quer sua felicidade. É uma tarefa grande, mas não impossível.
Juiz de Fora, 13 de dezembro de 2022
*Leigo católico, nascido em 1943, doutor em sociologia, foi professor nos Programas de Pós-graduação em Ciência/s da Religião da UFJF e PUC-Minas. É membro de Iser-Assessoria e da Coordenação do Movimento Nacional Fé e Política.