Lavar os pés

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LAVAR OS PÉS

Você já lavou os pés de alguém? Eu já lavei os pés de alguém? Já lavamos os pés de alguém? O gesto é incomum, a não ser quando a mãe ou o pai lavam os pés de filhos e filhas, ou estes lavam os pés dos pais idosos, ou são lavados os pés de alguém doente no hospital.

Na narração do evangelista João, “Jesus levantou-se durante a ceia, tirou o manto, atou uma toalha à cintura, pôs água numa bacia e começou a lavar os pés de seus discípulos, secando-os com a toalha. Tendo terminado de lhes lavar os pés, pôs o manto, sentou-se à mesa e disse: Entendem vocês o que eu fiz? Vocês me chamam de Senhor e Mestre. E dizem a verdade, porque o sou. Se eu, que sou o Senhor e o Mestre, lavei os pés de vocês, também vocês devem lavar-se os pés uns aos outros” (Jo 13, 4-5, 12-14).

O tema da Campanha da Fraternidade/2015 (CF/2015), promovida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), é ‘Fraternidade: Igreja e Sociedade’ e o lema é ‘Eu vim para servir’ (Mc. 10,45). A foto da CF/2015 retrata, como diz a contracapa do Texto-Base, “o Papa Francisco lavando os pés de um fiel na Quinta-feira Santa de 2014. A igreja atualiza o gesto de Jesus Cristo ao lavar os pés de seus discípulos”.

A Campanha da Fraternidade inspira-se no gesto de Jesus, repetido no gesto e nas palavras do Papa Francisco. Inspira-se também nas palavras de Jesus: “Como vocês sabem, os que são considerados como chefes das nações as governam como se fossem seus donos. E os poderosos as oprimem com seu poder. Porém, entre vocês não deve ser assim. Ao contrário, o que quer chegar a ser o mais importante, faça-se servidor de todos. O que quer ser o primeiro seja o servo de todos. Assim como o Filho do Homem, que não veio para que o sirvam, e sim para servir e dar a sua vida em resgate de muitos” (Mc 10, 42-45). Inspira-se na Comunidade Primitiva dos primeiros cristãos: “A assembleia dos fiéis tinha um só coração e uma só alma. Ninguém considerava como seu o que possuía, mas todas as coisas lhes eram comuns. Não havia entre eles nenhum necessitado, porque todos os que tinham campos ou casas as vendiam, entregavam o dinheiro aos apóstolos, os quais repartiam a cada um segundo suas necessidades” (Atos 4, 32-35).

O tema e o lema da Campanha da Fraternidade vêm em momento mais que oportuno no Brasil e no mundo. Os tempos são de política em baixa. Os tempos são de denúncias de corrupção. Os tempos são de guerras e mortes em muitas partes do mundo. Os tempos são de crise, desemprego em outras partes. Os tempos são de preconceitos e intolerância. Os tempos são de dominações de variados tipos. Os tempos são de poder que invade a vida e a intimidade das pessoas. Os tempos são de domínio do dinheiro, da vaidade, do luxo.

A CF/2015 tem por objetivo geral “aprofundar, à luz do Evangelho, o diálogo e a colaboração entre a Igreja e a sociedade, propostos pelo Concílio Vaticano II, como serviço ao povo brasileiro, para a edificação do Reino de Deus”. E tem, como objetivos específicos, entre outros: Identificar e compreender os principais desafios da situação atual; aprofundar a compreensão da dignidade da pessoa humana, da integridade da criação, da cultura da paz, do espírito e do diálogo inter-religioso e intercultural, para superar as relações desumanas e violentas; atuar profeticamente, à luz da evangélica opção preferencial pelos pobres, para o desenvolvimento integral da pessoa e da construção de uma sociedade justa e solidária.

Neste contexto, preocupa-se e propõe o diálogo e a colaboração em vista do bem comum, a superação da violência e a construção da paz, conselhos paritários e participação social, participação na reforma política. O Papa Francisco falou na Jornada Mundial da Juventude, Rio de Janeiro, 2013: “Educação, saúde, paz social são as urgências do Brasil. A Igreja tem uma palavra a dizer sobre estes temas, porque, para responder adequadamente a esses desafios, não são suficientes soluções meramente técnicas, mas é preciso ter uma visão subjacente do homem, da sua liberdade, do seu valor, da sua abertura ao transcendente.”

D. Leonardo Steiner, Secretário Geral da CNBB, escreve na Apresentação do Texto-Base: “Sociedade vem de ‘socius’ e ‘id’, idade, que diz da força, vigor do ‘socius’. ‘Socius’ é o companheiro. A força que faz e deixa ser companheiro. Companheiros os que, unidos pela mesma força e vigor, formam um grupo. Os que unidos pela mesma força e vigor formam a sociedade.’

A Campanha da Fraternidade/2015 chama a lavar os pés não só de filhos e filhas, ou de pais doentes ou idosos. Chama a lavar os pés no sentido concreto e imediato: serviço, diálogo e cooperação entre Igreja e sociedade, promoção e defesa da justiça social, proteção dos direitos fundamentais, políticas públicas com participação social, reformas estruturais na sociedade. E chama a lavar os pés no sentido simbólico: despojamento, humildade, poder-serviço, compromisso com quem mais precisa, solidariedade.

Selvino Heck

Assessor Especial da Secretaria Geral da Presidência da República

Da Coordenação Nacional do Movimento Fé e Política

Em vinte e sete de fevereiro de dois mil e quinze