Jesus diante da relação entre Religião e Política

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Neste XXIX domingo comum do ano, o evangelho lido pelas comunidades (Mateus 22, 15 a 21) nos traz obrigatoriamente a discussão sobre como se dá a relação entre o caminho da fé e a realidade política.

Este domingo ocorre em plena campanha eleitoral para prefeituras e câmaras municipais. Provavelmente, por todo o Brasil, muitos padres, pastores e animadoras de culto dominical dirão que este evangelho ensina a separar religião e política. Fazendo uma leitura superficial do texto, concluem que o fato de alguém ser cristão nada tem a ver com a escolha do candidato ou candidata, nem com o apoio ou a oposição a esse governo que está destruindo o Brasil. Para corrigir esse grave erro é preciso levar em conta a realidade da Palestina nos tempos de Jesus. Vejamos, então, a cena narrada por Mateus.

Os fariseus querem armar uma cilada para Jesus, e pedem a colaboração dos herodianos – o grupo que dá sustentação política a Herodes, governante inteiramente submisso ao Império Romano. Eles pensam que na frente deles Jesus não terá coragem de contrariar a legitimidade do imposto que pesava sobre os povos conquistados pelo exército romano…

Convém lembrar que o censo era o imposto resultante do recenseamento feito para atualizar a submissão dos povos conquistados ao Imperador, reconhecendo-o como Senhor daquele território. O evangelista deixa claro o tipo da cilada armada para Jesus. No grego, o verbo usado nesta passagem é o mesmo usado para pegar peixe ou pássaro com armadilha. Mas ao responder aos fariseus, Jesus cria outra situação que também é uma armadilha para os fariseus, ao pedir “mostrem-me a moeda do censo”. A moeda era o denário romano. Os fariseus caíram na armadilha quando mostraram a moeda que traziam no bolso. A lei de Deus proibia a idolatria, mas a moeda tinha a imagem do imperador e a inscrição referente ao divino César. Os fariseus foram assim pegos em contradição, porque pregavam todo rigor na obediência à lei.

É então que Jesus pronuncia a célebre frase: “Então, devolvam ao imperador o que é do imperador e a Deus o que é de Deus”. Longe separar religião e política. Ou bens materiais e espirituais, o recado foi claro: que a moeda romana volte para Roma, e Israel volte para o Povo de Deus. Pode-se comparar essa situação do tempo de Jesus com a situação da França durante a 2ª Guerra Mundial, quando foi ocupada pelo exército alemão. O povo francês queria é que os inimigos voltassem para a Alemanha, e deixassem a França em paz para o povo francês. A partir dessa compreensão, podemos retomar o texto bíblico e refletir sobre o que é de Deus e o que é do Imperador.

O que é de Deus e não podemos dar ao imperador? É de Deus a terra, como diz o livro do Levítico: “A terra pertence a Deus (Lv 25. 23). O que mais é de Deus? Junto com a Terra, as águas e todos os bens comuns que Deus dá a todos e para o bem de todos. Principalmente, é de Deus a irmandade humana. Ela tem de estar acima do mercado e não pode ser propriedade de nenhum Estado, porque Deus quer seus filhos e filhas livres.

Talvez se quem tivesse perguntado a Jesus se deveria ou não pagar imposto ao imperador de Roma fosse um lavrador da Galileia, a resposta de Jesus teria sido diferente, até porque o lavrador não teria moeda romana para mostrar… Mas retomemos agora o ensinamento de Jesus como critério de avaliação de nossas práticas políticas na realidade atual.

Quem vive a correta relação entre fé e política: os irmãos e irmãs que vivem em comunhão com as vítimas do sistema que domina o nosso país ou os religiosos evangélicos e católicos, aliados do governo que esperam se beneficiar com a decisão tomada pelo governo de desviar da educação pública uma parte do Fundeb para ajudar colégios religiosos?

Na encíclica Todos irmãos e irmãs, o papa Francisco deixa claro que a verdadeira religião deve inserir-se na Política em forma de expressão do amor social e do cuidado com o bem-comum. No Brasil, essa Política tem o nome e o sobrenome dos partidos populares que nesta campanha buscam retomar ou elaborar um projeto de País em favor do povo empobrecido. É por meio dessa Política, movida por uma espiritualidade cristã ou outra, ligada a alguma tradição religiosa ou não, que poderemos realizar o que pede o papa em sua encíclica: “Sonhemos como uma única humanidade, como caminhantes da mesma carne humana, como filhos e filhas desta mesma terra que nos alberga a todos, cada qual com a riqueza da sua fé ou das suas convicções, cada qual com a própria voz, mas todos irmãos e irmãs” Encíclica Fratelli Tutti, n. 8).

Francisco não faz mais do que ecoar, para o nosso tempo, o que Jesus deixou gravado no Evangelho que hoje refletimos. Cabe-nos ser fiéis a esse Evangelho que nos interpela à ação!

 

Marcelo Barros e Pedro A. Ribeiro de Oliveira